terça-feira, 28 de novembro de 2017

Opinião | Escrever no século 21 (*)

Foto: jornal La Jornada Baja California
O escritor do século 21 enfrenta o perigo de ver sua crítica estética desvanecer pelas leis comuns do governo, mercado, leitores, academia e internet.

A ordem desses poderes varia segundo cada país. Porém, todos eles controlam o escritor literário neste novo século.

A escrita literária se diferencia das outras por incumbir-se da arte da forma heterodoxa, o prazer estético verbal, o difícil vínculo entre tradição e inovação da palavra lúdica.

O escritor que está na crista da arte pertence ao presente, é contemporâneo de sua época e, ao mesmo tempo, pertence a outros tempos.

Quando um escritor pertence apenas ao passado, ele nada traz para a literatura; quando pertence apenas ao presente, quase não pertence à literatura.

O escritor deve ser infiel ao ontem e infiel ao hoje. Porém, antes de tudo, deve ser amante da arte, que é o projeto sensual de habitar uma temporalidade mais intensa.

Para os mortos, o artista pareceria um frívolo; para seus contemporâneos, um solene. O artista, de qualquer maneira, é um traidor da tradição e um traidor do agora.

Um escritor que está de acordo com sua sociedade está falhando.

O escritor é um inovador crítico. Artisticamente propõe formas mais complexas e menos repressivas que as do presente social – impertinência por partida dupla. Um escritor sempre termina por mostrar que o consenso está errado.

Para a arte, a própria verdade é insuficiente.

O escritor costumava distanciar-se através do livro, ou — ao menos — do texto; hoje, porém, o livro e o texto artístico são sentidos como anacrônicos ou não são identificados como diferentes de qualquer outra mídia ou texto.

Ao (e)leitor não interessa a particularidade estética. Para ele, tudo é texto, tudo é opinião, tudo é mídia.
Na tela tudo é julgado pelos mesmos critérios. Notícias, postagens, pdfs são consumidos por um mesmo jogo de regras.

A literatura é apenas um ramo da Publicação.

Essa uniformidade de juízo empobreceu os sentidos. Porém, o maior desafio do escritor dá-se para consigo mesmo. Por um lado, falar em desafio a si próprio implica um paradoxo na Época Telefísica da selfie para que outros te vejam (como tu te vês… conforme eles acham). Por outro lado, o correto é superar o consenso sem cair no egomorfismo (crer que tudo tem a forma do Eu) e crer que toda forma é firma.

Ser solidário em 99% a partir do dissenso radical de 1%.

E o escritor deve saber que tudo o que fizer será 100% processado por reações espetaculares. Escrever no século 21 é escrever dentro do espetáculo.

Tudo o que o escritor faz hoje é lido por critérios do mundo do espetáculo, exercido por mercado de trabalho, redes sociais, editoras e instituições.

O século 21 é o primeiro século em que a literatura é uma zona dentro do espetáculo.
A partir de agora sair do espetáculo é o grande desafio do escritor.

(*) Texto traduzido pelo site brasileiro Sibila, original em espanhol de HeribertoYépez (escritor, poeta e tradutor mexicano, professor da Escuela de Artes da Universidad Autónoma de Baja California.) | 24 ago 2015
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